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G1 | Márcio Falcão | 30/08/2024 | Luiz Friggi
Zanin nega recurso da Starlink contra decisão de Moraes que bloqueou contas da empresa
Moraes argumentou que existe um ‘grupo econômico’ sob o comando de Elon Musk, que inclui tanto a rede social X quanto o serviço de internet via satélite Starlink. E que, por isso, poderia bloquear bens da Starlink para cobrar multas do X.
O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou na noite desta sexta-feira (30) o recurso da empresa Starlink contra a decisão do ministro Alexandre de Moraes que bloqueou as contas da companhia no Brasil.
A decisão de Zanin foi processual, ou seja, nem analisou o mérito. O ministro entende que o tipo de ação usada pela defesa não é adequado para tratar da questão, e que ela deve recorrer de outra forma.
Zanin não viu abusos na decisão de Moraes que determinou bloqueio.
Moraes argumentou que existe um “grupo econômico” sob o comando de Elon Musk, que inclui tanto a rede social X quanto o serviço de internet via satélite Starlink. E que, por isso, poderia bloquear bens da Starlink para cobrar multas do X. Especialistas discordam desse entendimento jurídico (veja mais abaixo).
A determinação de Moraes para bloquear as contas da Starlink surgiu após a rede social X encerrar suas operações no Brasil em 17 de agosto, sem atender a uma ordem judicial de designar um representante legal no país.
Sem a possibilidade de responsabilizar diretamente o X, Moraes bloqueou os recursos financeiros do grupo Starlink Holding para garantir o pagamento das multas aplicadas pela Justiça brasileira contra a rede social.
A decisão visa assegurar o cumprimento das penalidades impostas após o X não retirar do ar perfis que violaram as leis brasileiras, disseminando informações falsas e ataques contra instituições democráticas.
A Starlink utilizou suas redes sociais nesta quinta-feira (29) para se manifestar sobre o bloqueio de suas contas. Em uma postagem na plataforma X, a empresa qualificou a decisão de Moraes como “inconstitucional” e declarou sua intenção de recorrer na Justiça.
Elon Musk também se pronunciou em seu perfil, argumentando que a SpaceX — da qual a Starlink é uma divisão — e o X são “duas empresas completamente diferentes, com acionistas diferentes”. Musk afirmou que possui 40% da empresa e criticou a decisão do ministro, chamando-a de “absolutamente ilegal”. “Essa ação absolutamente ilegal do ditador Alexandre de Moraes pune indevidamente outros acionistas e o povo brasileiro”, escreveu Musk.
A Starlink, que opera no Brasil fornecendo serviços de internet por satélite, especialmente na região Norte, argumentou que a decisão de responsabilizá-la pelas multas do X é “infundada” e que foi emitida “em segredo”. A empresa alegou que não recebeu o devido processo legal garantido pela Constituição brasileira e que pretende “abordar o assunto legalmente”.
Além disso, a Starlink afirmou que uma ordem emitida no início desta semana pelo STF congelou suas finanças e impediu a companhia de realizar transações financeiras no país. Mesmo assim, a empresa destacou que está fazendo “todo o possível” para que seus serviços de conexão à internet não sejam interrompidos, mencionando que atende a mais de um quarto de milhão de clientes no Brasil, de regiões como a Amazônia até o Rio de Janeiro, incluindo pequenas empresas, escolas e serviços de emergência.
As decisões mais recentes de Moraes contra as empresas de Musk foram criticadas por juristas ouvidos pelo g1 e pela TV Globo.
Mestre em direito pela Universidade de São Paulo e professor da PUC Minas, Clóvis Bertolini avalia que a decisão de Moraes “foge do padrão”, entre outros motivos, pela forma de intimação, que se deu por meio de uma postagem dentro do próprio X.
“Essa decisão foge um pouco do padrão de intimações e de determinações que o Poder Judiciário brasileiro, especialmente o STF, realiza quando intima as partes a respeito da tomada de decisões”, diz Bertolini.
“No meu entendimento, essa decisão acaba por violar os dispositivos legais, Código de Processo Civil, Código de Processo Penal… Então, no meu entendimento, essa decisão é nula”, avalia.
Especialista em direito digital, o advogado Renato Opice Blum afirma que, pelas regras do Código de Processo Civil, quem responde a uma demanda deve ser o destinatário da ordem judicial.
Quando há fraude ou desvio de finalidade, segundo Blum, é possível que a Justiça emita uma ordem mais abrangente para alcançar outras empresas do mesmo grupo, como feito por Moraes.
Mesmo assim, diz o especialista, é preciso “respeitar o devido processo legal”.
“Tem que ter um procedimento que apure, que confirme isso. Eu tenho que ter o direito de defesa, eu tenho que ter uma justificativa de que realmente aquela empresa integra [o mesmo grupo econômico] e daí por diante. Normalmente, não é uma decisão liminar de imediato que simplesmente desconsidere a personalidade jurídica e já automaticamente saia de uma empresa que tá nesse processo para outra empresa”, diz Opice Blum.
“Tem que seguir aí um determinado rito, que eu acho que isso também vai pro plenário e provavelmente deve, pela jurisprudência, ser suspenso.”
Para o especialista, decisões que bloquearam contas da Starlink devem ir ao plenário do Supremo
Especialistas ouvidos pelo Valor Econômico também criticam a decisão – veja o que eles dizem:
Luiz Friggi, sócio da área Cível e de Resolução de Conflitos do Simões Pires Advogados: diz que, mesmo para responsabilizar empresas de um mesmo grupo econômico, há procedimentos a serem seguidos. “E, ao que parece, não foram seguidos. É uma empresa com outros acionistas, de outro setor. Essa decisão pode ocasionar a saída da Starlink do Brasil.”
Lenio Streck, jurista: “A Starlink é outra empresa. Ser do mesmo grupo econômico não quer dizer que seja corresponsável por uma dívida da qual não participou e nem se defendeu”, diz. O que a Starlink poderia ter feito para evitar o comportamento da outra empresa? Empresas possuem personalidade jurídica própria.”
Marcela Mattiuzzo, advogada responsável pelas áreas de tecnologia do VMCA Advogados: diz que, na área administrativa, é relativamente comum que se puna o grupo econômico como um todo. Mas que é preciso entender se a Starlink tem como único sócio o Elon Musk – sob pena de prejudicar os outros membros do quadro societário com a decisão.
A Starlink é um braço da SpaceX, a empresa de exploração espacial de Elon Musk. O serviço trabalha para criar uma “constelação” de satélites para fornecer conexão de internet a áreas remotas e com pouca ou nenhuma infraestrutura.
Em 2022, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, a Starlink recebeu autorização da Anatel para operar no Brasil até 2027. Além do Brasil, o serviço está disponível em vários países da América do Sul, incluindo Chile, Peru, Colômbia, Equador, Argentina, Paraguai e Uruguai, com expansão planejada para a Guiana, Suriname e Bolívia nos próximos anos.
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